Luto

A perda de um ente querido é um desafio imenso para a maioria das pessoas, podendo afetar o funcionamento individual ou até mesmo familiar. É importante contextualizar a evolução do lidar com a morte ao longo da história. Até a idade média, o convívio com a morte era naturalizado, mais presente no cotidiano e com bastante significado simbólico e religioso. Os avanços da ciência, o conhecimento do processo de finitude biológica e as mudanças sociais alteraram profundamente como lidamos com a perda. Houve uma busca cada vez maior pelo prolongamento da vida, pelos ideais de sucesso e conquista. Passou-se, então, a encarar o morrer como uma falência, uma incapacidade, um tema a ser escondido, a ser vivenciado de maneira solitária e reprimida. O luto pode sinalizar o falecimento de alguém próximo, mas também pode ser estendido a outras perdas tais como rompimentos de relações, saída de empregos ou morte de animais de estimação.

O luto é uma doença?

É necessário compreender que o luto é um processo natural e necessário de elaboração de uma perda, que manifesta diversas emoções e deve ser respeitado. Como vivenciamos esse luto depende dos conceitos de morte, dor e perda que trazemos na história pessoal. Também a proximidade com o ente perdido e a maneira em que se deu o falecimento influenciam bastante o desfecho. Geralmente perdas repentinas, como por exemplo por acidentes ou AVC, estão associadas a dores e questionamentos mais prolongados.

Existem fases no luto?

Existem algumas fases do luto que são descritas por alguns autores, sendo as mais conhecidas as de Elisabeth Kübler-Ross. A primeira fase seria a negação e isolamento, em que existe dificuldade em assimilar o evento, uma espécie de entorpecimento, um não entrar em contato com as reais emoções. Não acreditar na notícia ou que pode tratar-se de um engano são possíveis reações deste momento. O segundo estágio é o da raiva, quando é manifesta a revolta pelo acontecimento. Agressividade e perguntas como “por que ele?” surgem nesta hora, além de sentimento de culpa e busca de responsáveis. A seguir, a barganha ocorre quando acordos são feitos com figuras que podem intervir na situação, aliviando ou adiando consequências e temores da perda. Pode ocorrer na iminência da morte, sendo as pactuações internas ou com o sagrado. São comuns “promessas”, pedidos por mais tempo, determinações sobre projetos inacabados. A depressão, quarto estágio, é dividida em reativa e preparatória. A primeira ocorre quando outras perdas são percebidas em decorrência do falecimento, tais como perda de emprego, de função e dificuldades financeiras. A preparatória indica um movimento de aquietar-se, refletir sobre os acontecimentos, sobre o que foi vivido até aquele momento, sobre os significados do ente envolvido e também da sua própria jornada. Apatia, tristeza e angústia geralmente ocorrem na fase depressiva. Por fim, dentro de um processo esperado de luto, chega-se à aceitação, quando, mesmo diante da saudade, há maior serenidade em relação à perda, os sentimentos são expressos com mais clareza e o funcionamento se reorganiza para dar continuidade à própria vida. Não necessariamente as fases são todas vivenciadas ou seguem sempre essa ordem, podendo aparecer emoções e comportamento de um estágio em outros momentos.

Existe tempo certo para o luto?

Apesar de alguns autores e manuais diagnósticos sugerirem períodos como seis ou 12 meses, o luto é um processo individual, sendo variável a depender inclusive da forma em que ocorre o falecimento. Pessoas que perderam crianças, filhos ou quando o óbito foi repentino, tendem a ter lutos mais prolongados. 

E se o luto não for vivenciado?

O luto é um processo necessário para elaborar a perda do objeto de afeto. Caso ele seja inibido ou adiado, pode ocorrer fixação em uma das fases ou as emoções podem retornar futuramente. Não se permitir sofrer ou ocupar-se com várias outras tarefas não impedirá que aspectos do luto ocorram ao longo do tempo, podendo, inclusive, tornar a experiência confusa e disfuncional.

Quando devo me preocupar?

Quando existe uma dificuldade nesse processo, com intenso e prolongado sofrimento, que afeta o funcionamento normal do indivíduo, podemos estar diante de um luto complicado. Pessoas que deixam de trabalhar, de relacionar-se, de realizar autocuidado estão diante de um processo complexo e persistente de luto, necessitando de ajuda profissional.

O que pode ser feito nos casos complicados?

Ajuda psicoterápica costuma ser um ótimo ponto de partida para elaborar a perda. O indivíduo com luto complicado deve ser ouvido, pois, muitas vezes, familiares se queixam do tempo excessivo de sofrimento. Entender as crenças sobre a perda, sobre o ente querido e suas funções, ressignificando os pensamentos disfuncionais e encerrando esse momento de modo a propiciar o resgate das perspectivas de vida é um trabalho extremamente importante. Quando os sintomas tomam escopo, atrapalhando o funcionamento cotidiano (sono, apetite, disposição, humor, etc), uma intervenção medicamentosa pode ser proposta.

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